terça-feira, maio 30, 2006


Exílio cá dentro

Hoje, de manhã, a Antena Um ocupou uma hora de emissão a debater exaustivamente a cobertura que tem preparada para o Mundial da Alemanha. Note-se que eu gosto de futebol e não tenho pejo em visionar pela milionésima vez o calcanhar de Madjer, a mão de Deus de Maradona e essoutras epifanias que definem a civilização, tal como a conhecemos. Mas aqui a notícia não era o Mundial, antes a forma como a estação o cobrirá. Experientes jornalistas da casa interrogavam veteranos jornalistas da casa, numa orgia de agudezas candentes, de deixar suspensa a alma mais empedernida (ó Afonso Domingues, o que é que pensas da nossa fabulosa cobertura?), enquanto o jornalista-da-casa-que-vai-cobrir-o-Brasil confessava emocionado ao jornalista-da-casa-que-vai-cobrir-Angola que a sua cobrição era o culminar do sonho de uma vida. Qualquer semelhança entre esta alarvice e jornalismo é puro onanismo.

E ainda agora a procissão vai no Templo de Diana. A selecção estagia pelo Alentejo, como se sabe a zona de Portugal onde as condições climatéricas mais se assemelham às da Alemanha, preparando-se para concorrer em termos de igualdade com o Irão. Sim, que não nos irão apanhar órfãos de canícula!

Agora imaginem todos os vindouros momentos de glória para cobrir: a partida da selecção, com um especial Toda a verdade sobre o conteúdo de cada saco de viagem; a chegada da selecção a Colónia, com um debate sobre o jet lag e a sua possível influência na performance contra Angola; os hotéis da selecção, com entrevistas aos vários paquetes disponíveis; os jogos de sueca dos defesas centrais da selecção, comentados por Marcelo Rebelo de Sousa, que aproveitará para apresentar a sua revolucionária teoria - e se jogassem bridge?

Isto para além das pérolas de sabedoria que hordas de denodados jornalistas arrancarão a todos os intervenientes ocasionais na epopeia, incluindo um primo afastado da cunhada do roupeiro, a namorada do irmão do segundo cozinheiro e as dezenas de milhares de famílias emigrantes que vão ter direito a quinze segundos de antena, sim que aquilo é quase como jogar em casa, e Herr Serafim Santos, torneiro mecânico de Fornos de Algodres, residente em Frankfurt vai para vinte e dois anos, tem tanto, mas tanto, para nos dar como comentador futebolístico… tudo multiplicado por três, que Brasil e Angola são povos irmãos e também têm direito a ser muito bem cobertos.

Por isso vos digo: estou decidida ao exílio. Na impossibilidade de me instalar fisicamente na Patagónia profunda durante o próximo mês (com uma boa parabólica, claro) estarei em Portugal de corpo presente, com o espírito nas pampas. O rádio do carro morto de mudo, a televisão barrada no Discovery Channel - que quem discover não cobre – e jornais vadre retro! Serei uma ilha de ignorância no mar da trivia mundialista. Uma estranha neste país estranho. Emergindo em alturas seleccionadas, durante curtos períodos de uma hora e quarenta e cinco minutos. Porque alguém tem de torcer pelo Togo.

segunda-feira, maio 22, 2006


Karma?


Musa andaluza, George Apperley, 1930



Quando me irrito, por qualquer motivo, com qualquer coisa que de inesperado me acontece, rosno, não falo nem grito, rosno mesmo: "Isto não está a acontecer, isto é Karma!" Quando a coisa me parece mais grave utilizo a expressão mais exasperada e, portanto, também mais abreviada: "Isto é Karma!"

Num destes dias entrei na recepção e vi que uma das funcionárias confortava a recepcionista (angustiada com algum problema pessoal) dizendo: "Deixe estar, isso acontece, pronto, deixe estar... – e já em desespero – olhe, não ligue: isso é Cármen!"

Esqueci-me do que ia fazer à recepção e dei meia volta muda.

Quando nos acontece qualquer coisa de inesperadamente desagradável, não se culpem sacanas de colegas, filhos de mãe alheia, o resultado do Karma ou qualquer desígnio divino. Não, não vamos mais longe: a verdadeira culpada é a rameira da Cármen.

quarta-feira, maio 17, 2006


Depois admiram-se



... que esta coisa tenha sido um fracasso.
Ele há mesmo símbolos perdedores.

domingo, maio 14, 2006


Bititulares!


Sai uma dobradinha para a mesa dos campeões...

sábado, maio 13, 2006


Imaculado

Normalmente, evito comentar os delírios de Carrilho. Por dois motivos. Primeiro, tem uma mulher bonita e as pessoas bonitas – bem como as que com elas andam - são amiúde alvo da maledicência de multidões de feiosos roídos de inveja. Como os linchamentos me dão urticária e fico eriçada quando alguém é atacado por exterioridades, dou sempre uma margem de manobra a gente bonita e a quem usufrui dessa beleza. Eu sei que isto é paternalismo e uma forma invertida de preconceito, mas que se há-de fazer, os preconceitos às avessas são subprodutos da herança de uma europeia liberal. Que não repreende um funcionário emigrante com a facilidade com que, pelos mesmíssimos motivos, repreenderia um indígena. Que recusa apelidar de tonto o velhote a quem chamaria de energúmeno se o soubesse com menos vinte anos. A Bárbara y su muchacho merecem o mesmo tratamento que o ucraniano ilegal ou o octogenário com arteriosclerose.

Depois também evito falar de Carrilho porque não há palavras para a incomensurável asnice que o leva a postular que os outros o vêem como ele se mira reflectido no espelho do seu narcisismo. Convicto que o mundo não o merece, Carrilho? Pois não merece, mesmo. You’re so fired…

quinta-feira, maio 11, 2006


Sob o signo da mitomania


Respeito, muito respeitinho

Pedro Lomba, no seu artigo na Atlântico de Maio (finalmente, encontrei a revista num quiosque e gostei - só achei estranho a assinatura anual não ter qualquer bónus/brinde), escreve sobre um tema, digamos, interessante: os hipocondríacos.

Ora, antes de mais, ressalvo: também eu não padeço de tamanha enfermidade. Mais, esta alegada doença repugna-me; parece-me tortuosa e bera. Para dizer a verdade, até me assustei. Quer dizer, pela minuciosa, atenta e tenaz descrição dos sintomas, fiquei circunspecto e, até, concedo, mais atento. Não é atento, atento, até ao ponto de pensar, sequer remotamente, que poderia padecer de tamanha enfermidade, mas numa outra perspectiva, a da mera e circunstancial tomada de conhecimento.

Enfim, já não sei bem a que propósito, queria acrescentar que o hipocondríaco não só sofre ante a perspectiva omnipresente da grave e raríssima doença que apenas a ele consome, como perante aquele sumário e eterno segundo que antecede o pronunciamento do técnico (médico). Na verdade, àquele momento feroz precede uma outra angústia de diverso tom, mas idêntica intensidade: a "minha" maleita está, francamente, muito à frente do que alguma vez foi dado a ver ao especialista. É inédita, singular e minha!

É verdade, sub-repticiamente, emerge uma tremenda satisfação: não há nada de grave. Mas, bolas, o despiste não terá sido completo. Não pode. Jamais!

quarta-feira, maio 10, 2006


Este é supimpa

Addio, adieu, aufwiedersehen, goodbye,
Amore , amour, meine liebe, love of my life.
Se o nosso amor findar,
Só me ouvirás cantar,
Addio, adieu, aufwiedersehen, goodbye,
Amore , amour, meine liebe, love of my life




Você preenche todos os requisitos para ser o chamado "cidadão do mundo". Adora viajar e imagina o dia em que pega na sua mala de cartão e parte à conquista do mundo. É alguém vivido, sempre a olhar para a frente e que gosta do imprevisto.

Via alguém que esconde manias bizarras; uma romântica e uma Linda de Suza com'eu.


Momento de filatelia

Os tipos dos selos estamparam-se.

segunda-feira, maio 08, 2006


É choro não poder falar

Bright eyes,

Hoje apeteceu-me falar-te e, claro, não me atendeste o telefone.

Há já uns tempos que não saímos todos.

Há já uns tempos, também, que não rimos juntas e falamos, alegre ou seriamente sobre o nosso mundo.

Lembro-me da centelha viva nos teus olhos pardos em troca de confidências, da gozona cumplicidade que nos unia, do teu riso solto e contagiante. Lembro-me do ar sério que punhas no ecumenismo quando divergíamos em relação ao teu deus, esse mesmo a quem rezaste pelo meu filho, esse que – dizias tu – te emprestava força para, todos os dias, ma transmitires.

Lembro-me, ainda, da coragem e da dignidade com que perdeste uma boa parte da tua fortuna e, com ela, os falsos amigos que te rodeavam.
Tu e o António – então gravemente doente – dispensaram o chauffeur, as mordomias e as grandes colecções, restando-vos um conforto elegante e um punhado de "irredutíveis" que não chegou à dezena.
Perante a minha revolta, lá vinha o teu deus à baila:
- Deus escreve direito por linhas tortas – insistias tu nessa frase feita sem significado – se isto não tivesse acontecido, nunca saberia quem eram os meus verdadeiros amigos.
- Ora, ora, os amigos reconhecem-se nas dificuldades e essa ordinareca meio-pseudo que babava com o lustre da tua avó, foi deus que a chamou ou foi ele que lhe disse que se fosse embora?
- Ai, Francisca, não percebes nada! Deus põe-nos sempre à prova, eu ganhei e ela perdeu!

Impossível…

Aqui há menos de um ano, a meio de um jantar dessas noites de sexta-feira de perdidos fados e guitarradas, falaste-me de um tumor que te tinham descoberto. A tua voz era firme quando falava do medo, mas os teus olhos pardos e brilhantes reflectiam a luz tremulinada da vela à nossa frente.
Abracei-te – aproveitei o momento para reter as lágrimas com que me tinhas contagiado – e lembrei-te a frase da tua mãe nessas ocasiões: "Olhe Manel, veja lá se me trata porque, agora, não me apetecia nada morrer!"
Os teus olhos voltaram a sorrir e o fado calou-nos.

A tua operação correu bem mas, quando te fui ver (e te beijei a cabeça que insiste em rapar) tinhas uma canula na garganta e escreveste numa folha de bloco que me entregaste: "É choro não poder falar".

Seis meses depois, cabelo à rapazinho, celebraste, e nós contigo, a total recuperação.
Os teus olhos, minha querida, os teus brilhantes olhos, flamejavam de risonha vitória.

Antecipámo-nos, toda a vitória é efémera.

Passados três meses, minavam-te metástases sem explicação.
Era uma questão de tempo…
Dispuseste para a vida que te restava:
- Mais citostáticos não. Quando entrar em coma não quero internamentos, quero que me deixem morrer.
Foi há um mês… duraste tão pouco.

Bright eyes,
Burning like fire.
Bright eyes,
how can you close and fail?
How can the light that burned so brightly
suddenly burn so pale?
Bright eyes…


O que tu te ririas se estivesses, agora, aqui comigo. Imagina que quase todos os dias rezo. Uso a medalha que o António me entregou em teu nome na pulseira (vê o piroso da coisa) e, afagando-a, rezo a única oração que conheço dessa religião e peço a um deus impossível que se invente e te não desiluda, a ti que já não existes, mas que não me és, ainda, só memória.

É que eu telefono-te e tu não me atendes… tinhas razão: É choro não poder falar.

quinta-feira, maio 04, 2006


Slow motion

Proliferam pelos vários canais de televisão séries sobre médicos e hospitais: House, Chicago Hope, ER, Scrubs, até o sucedâneo Hospital Central com que o AXN preenche as madrugadas sem clientela e o menos centrado Nip & Tuck. Em comum, a batida frenética da acção. Consta que a TVI está a preparar uma série semelhante, que se irá chamar "Urgências". O problema é que Manoel de Oliveira, o realizador que poderia fazer jus ao ritmo das nossas, não parece lá muito pelos ajustes.

terça-feira, maio 02, 2006


Isto para não falar no subsídio de risco

Quando for grande...? Qual juiz, qual cirurgião, qual astrofísico... criança ambiciosa nos nossos dias quer é ser especialista de pessoal. Uma profissão de futuro. Quase tanto quanto especialista de vegetais, cujas reformas em breve rebentarão com os tectos da segurança social. Já os especialistas de minerais são um bocado calhaus e nunca conseguirão ultrapassar os juízes de primeira instância.

AS 3 REFORMAS MAIS ALTAS DE JANEIRO A MAIO DE 2006 (*)
1 - Carlos Eduardo Tavares Silva Marques (CTT Correios de Portugal, SA - Especialista de Pessoal - 6463 euros
2 - José Moitinho Almeida (Ministério da Justiça - Juiz-conselheiro do Conselho Superior de Magistratuta) - 5748 euros
3 - Álvaro Sousa Reis Figueira (Ministério da Justiça - Juiz-conselheiro do Conselho Superior de Magistratuta) - 5663 euros

(*) Daqui


A semana do trabalho político fundamentado

Comemora-se entre 12 a 16 de Junho: terça-feira, dia 13, é o feriado municipal de Lisboa e quinta-feira, dia 15, é o feriado nacional do Corpo de Deus.